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Relação com os textos

    À luz das aulas e com base nos textos: “Cultura popular: as construções de um conceito na produção historiográfica” e “A identidade cultural na pós-modernidade”, dos autores Petrônio Domingues e Stuart Hall, respectivamente, é possível perceber que diversos conceitos, como da resistência da cultura popular; do sujeito pós-moderno; do hibridismo; e do “biculturalismo”, presentes nos textos, são completamente relacionáveis com o trabalho proposto.

  

    Sendo assim, à vista do texto de Petrônio Domingues, o marxista Edward Palmer Thompson diz que cultura popular não é apenas um conjunto de valores e atitudes, mas sim algo que está localizado no campo das relações sociais:

   

"Espero que a cultura plebeia [seja] um conceito mais concreto e utilizável, não mais situado no ambiente de “significados, atitudes, valores”, mas localizado dentro de um equilíbrio particular de relações sociais, um ambiente de trabalho de exploração e resistência à exploração, de relações de poder mascaradas pelos rituais do paternalismo e da deferência." (THOMPSON, 1998, P. 17).

   

     Desse modo, o Hip Hop se mostra como representante dessa resistência devido às circunstâncias de sua origem nas comunidades jamaicanas, latinas e afro-americanas nos Estados Unidos, bem como seu atual papel nas grandes periferias do Brasil. Violência, racismo, tráfico de drogas, carência de infraestrutura e educação permeavam tais comunidades, fazendo-se necessário um meio de canalizar essas mazelas afim de evitar a inserção às gangues como única saída para os jovens. Portanto, historicamente, fica claro que o Hip Hop nasceu de uma forte resistência negra e ainda persiste nessa raiz. Sendo assim, esta cultura é uma maneira de resistir à marginalização imposta aos moradores de periferias, tornando-se um meio diferente de viver, diferente das gangues e do crime.

  

     Devido à esses aspectos, a classe social que permeia o Hip Hop e representa as expressões tanto musicais, quanto visuais, é a esfera socioeconômica mais baixa da sociedade – a qual é a mais afetada pelos problemas citados. Portanto, tendo em vista o evento que o grupo participou, surge um paradigma: uma proposta cultural que busca reproduzir esse estilo e suas características, não deveria visar como questão importante a audiência dessa classe social que produz uma cultura popular pela resistência, para que haja, de fato, uma representação da cultura e das identidades expressas? Pois, infelizmente, a partir do que foi observado pelo grupo, não era para este público que o evento se destinava.

   

   Para explicar tal perspectiva, basta levar em conta as observações feitas pelo grupo  descritas na outra página (de observações), ou seja, não só os preços e códigos, como também os aspectos sociais percebidos no local. Então, têm-se a conclusão de que o evento não foi planejado para ser prestigiado por quem está diretamente ligado às construções dos conceitos dessa cultura, mas sim por quem a contempla – que de uma certa forma acaba apoderando-se da mesma, tornando-a parte da cultura erudita. Portanto, é certo concordar com o que Stuart Hall fala no texto de Petrônio Domingues: “nesse aspecto, a cultura popular é um campo de disputa, um dos locais de engajamento da luta a favor ou contra a ‘cultura dos poderosos’”.  

    

    Já no caso do jazz, que teve sua origem em uma fusão de relações que prosperaram nos campos de algodão e tabaco na américa do norte no séc. XVIII, também surge na cultura negra e não se tratava apenas de um espetáculo, mas era uma forma de comunicação, já que se tratava de uma comunidade que desconhecia a comunicação escrita, sendo estritamente oral. Eram performances de cunho religioso, nas quais os ritmos e etnias diferentes tinham em comum o mesmo ritual, como dançar para a chuva para pedir fecundidade, para celebrar nascimentos, e outros.  Apesar de sua raiz ser negra, foram os brancos que começaram a dançá-la, primeiro em lugares abertos, pois os negros, em sua condição de escravos, entretinham seus amos e estes elevaram as mudanças da dança africana transformando-a em jazz.* Esses acontecimentos reafirmam a tese de Stuart Hall descrita na página 415 do texto de Petrônio Domingues: “Os repertórios culturais negros foram (e são) influenciados. [...] Todas suas formas são sempre produto de sincronizações parciais, dos engajamentos que atravessam fronteiras culturais, ‘de confluências de mais de uma tradição cultural, de negociações entre posições dominantes e subalternas. [...]’” Nesse sentido, é possível compreender a suposição de que o Jazz seja considerado erudito, pois observando essa parte da história de seu nascimento, em que a elite elevou o Jazz à outro patamar, tem-se a ideia de que esse estilo se tornou parte da cultura erudita mesmo. Porém, a partir do que o grupo analisou no evento, essa dicotomia de erudito e popular não se fez presente. Tanto o Jazz, quanto o Hip Hop foram apreciados por um público comum, que aparentemente era a classe média, a qual tem por característica um certo “biculturalismo”.

  

     Este pode ser visto no texto de Petrônio Domingues, a partir da fala de Peter Burke: “[Burke] cunha o termo “bicultural” para descrever a situação de membros da elite (no caso do nosso evento, a classe média e média-alta) que se enfronharam nas práticas culturais populares e que, ao mesmo tempo, participavam de uma cultura “alta”, ensinada “em escolas secundárias, universidades, cortes etc., às quais as pessoas comuns não tiveram acesso””. Vários fatos já apresentados demonstram a realidade dessa definição, os preços elevados, o uso de roupas de marca por grande parte dos que foram ao evento e até mesmo a localização da Casa das Caldeiras indicam a condição econômica favorecida do público.  Desse modo, inferimos que as pessoas tinham acesso à cultura erudita e à cultura popular, caracterizando o “biculturalismo".

   

    Devido à todos esses motivos, ficou clara a posição do grupo em relação ao evento e ao fato de não ser possível enxergar o ‘choque de cultura’ esperado, por não ter a distinção do público entre os gêneros especificamente. pois, ainda que a elite tenha tido parte na difusão do Jazz, este continuou fazendo parte do contexto popular e significando tal cultura e suas identidades, mesmo que influenciado.

   

    Uma das razões prováveis para exemplificar o porquê de não haver um choque entre as culturas, além do que já foi apresentado, é a relação do evento com o conceito de hibridismo - por causa da coexistência de duas ideias, em teoria, contrastantes, hip hop e o jazz, que na prática, não eram. segundo Petrônio Domingues, “O que se qualifica de “erudito e “popular” está em permanente processo de ajustes, desajustes, reajustes, em suma, em movimento. Assim, tornar indissociável a divisão entre eles é anular os postulados metodológicos que procuram conferir um tratamento contrastado de um e de outro domínio”.  Baseado na frase acima, o hibridismo está muito ligado ao evento, pois o público transitava entre os dois ambientes de forma natural e sem restrições, prestigiando ambos os locais.

    

    Outra questão presente nos textos relacionada com o trabalho, foi a mutabilidade das identidades do sujeito pós-moderno, fruto da globalização, citada por Stuart Hall: “Esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam”. Exemplificando de maneira simples tal conceito, percebemos que no evento havia um indivíduo que ao trocar de pista trocava também sua roupa e seu comportamento, para se adequar melhor ao ambiente no qual estava, ora no hip hop, ora no jazz. Desse modo, torna-se perceptível a maleabilidade das identidades dos sujeitos pós-modernos, que de adaptam repentinamente ao local e às suas características.

   

         Dessarte, depreende-se que Não encontramos, em nosso evento, cultura popular vs erudita, encontramos uma cultura híbrida, com um público bastante homogêneo, apesar de diferente, e adaptado. Porém, o evento possibilitou diversas analogias aos textos propostos, proporcionando a associação do conhecimento teórico à prática na sociedade, o que permitiu com que o grupo refletisse bastante sobre os pontos levantados e absorvesse o valor de se estudar Identidades e Culturas.

*Bibliografia utilizada para falar sobre a história do Jazz:  http://www.revistas.usp.br/salapreta/article/view/57465/60454

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